sábado, 24 de maio de 2014

COSANPA cobra tarifa por serviço de esgoto. Mas que serviço?

Nos idos do mês de fevereiro de 2014, moradores de diversos logradouros da cidade de Belém receberam o seguinte comunicado da COSANPA (Companhia de Saneamento do Pará):


O comunicado emitido pela COSANPA anunciando a cobrança de uma “taxa de esgoto” se mostrou no mínimo curioso, tendo em vista que esse serviço é quase inexistente em Belém. Segundo os números em 2013 do Instituto Trata Brasil,  para o qual Belém é a segunda pior capital brasileira em termos de saneamento (ficando na frente apenas de outra capital da Região Norte, Macapá – AP), apenas 8,1% das residências de Belém são atendidas pelo serviço de coleta e tratamento de esgotamento sanitário.

Em março de 2012 uma Comissão Temporária Externa da ALEPA (Assembléia Legislativa do Pará) que investigou as denúncias de alagamentos, irregularidades e omissões na Bacia do Una após a conclusão do Projeto de Macrodrenagem, realizou verificações in loco e audiências públicas nas áreas da Bacia do Una mais atingidas por inundações causadas pelo transbordamento dos canais. O resultado deste trabalho está presente no Relatório Final dessa Comissão (2013), onde se conclui que na Bacia do Una não houve, conforme estava previsto, a implementação de Estações de Tratamento de Esgoto Sanitário ETE'S, de modo a não permitir o recrudescimento do nível de saneamento aduzido pelo Projeto de Macrodrenagem da Bacia do Una. Consta no mesmo relatório, como conseqüência da falta de Estações de Tratamento de Esgoto, que os dejetos das residências são despejados sem nenhum tratamento nos canais e consecutivamente lançados na Baia do Guajará.

Como pode a COSANPA cobrar uma taxa de 60% do valor do consumo de água a titulo do serviço de desobstrução das redes de esgoto e limpeza dos poços de visita, se o objeto desta cobrança é despejado sem nenhum tratamento nos 17 canais integrantes do sistema macrodrenante da Bacia do Una, trazendo doenças e colocando a população situação de risco e vulnerabilidade?
Diante da cobrança indevida por um serviço inexistente, a Frente dos Moradores Prejudicados da Bacia do Una procurou a Comissão de Direitos Humanos e Defesa do Consumidor da ALEPA (Assembléia Legislativa do Pará), a qual logo se pronunciou contra a “taxa de esgoto” da COSANPA. Como justificativa para suspensão da referida taxa, evocamos o Processo de nº 0014371-32.2008.814.0301 relativo à Ação Civil Pública movida contra o Estado, a Prefeitura e a COSANPA pela falta de manutenção das obras do Projeto de Macrodrenagem da Bacia do Una. Entre as obras cuja manutenção não foi realizada ao longo de aproximadamente 10 anos, está o sistema de esgoto precário implantado pelo Projeto Una.
Este sistema de esgoto foi implantado na época de execução do Projeto Una e posteriormente abandonado pela COSANPA, sendo hoje composto por fossas sépticas individuais que sangram em via pública exalando mau cheiro e fossas coletivas cuja manutenção nunca foi realizada. Nas conversas com habitantes de diversos pontos da Bacia do Una, observamos que são os próprios moradores que fazem a manutenção de suas fossas manualmente ou recorrem a empresas privadas como alternativa à inoperância da COSANPA diante das solicitações de limpeza e manutenção dos sistemas de esgoto. No caso das fossas coletivas a questão é mais complexa, pois estas necessitam de equipamento especial para sua manutenção. Se isto não ocorre, estas fossas de maior capacidade de acumulação se transformam em verdadeiras “bombas biológicas” com risco de explodir a qualquer momento. Em logradouros como, por exemplo, a Vila Freitas, localizada às margens do Canal do Galo na Travessa Antônio Baena entre Pedro Miranda e Marquês de Herval, os moradores foram autorizados a conectar "provisoriamente" a rede de esgoto pluvial  de suas casas à rede de esgoto sanitária, o que vem acarretando a sobrecarga da segunda rede e inúmeros transtornos.

Poço de Visitação sangrando em via pública na Passagem 22 de Novembro, Alameda da Conquista, Área de Ocupação da Travessa Antônio Baena entre Pedro Miranda e Marquês de Herval. Sub-bacia I do Projeto Una.


Fossa séptica coletiva sem manutenção implantada pelo Projeto Una na Passagem Santa Teresinha (área com pendência de microdrenagem), localizada na Travessa 9 de Janeiro entre Domingos Marreiro e Antônio Barreto. Sub-bacia I do Projeto Una.

Fossa séptica individual entupida causando o acúmulo de dejetos no meio-fio. Conjunto Residencial Paraíso dos Pássaros,  Quadra 31, Rua Primavera esquina com Avenida Rio Tapajós. Sub-bacia VIII do Projeto Una.

Percebendo que a cobrança indevida de sua taxa de coleta e tratamento de esgoto sanitário não passou despercebida por alguns cidadãos belemenses mais atentos e pressionada pela Comissão de Direitos Humanos e Defesa do Consumidor da ALEPA, a COSANPA desistiu de cobrar a vergonhosa taxa e emitiu o seguinte comunicado:


O comunicado acima não apresenta apenas um pedido de desculpas da COSANPA aos seus clientes, mas o reconhecimento formal de que em Belém não há manutenção da rede e nem serviço de tratamento e coleta de esgoto sanitário. A intenção deste post não é a de fazer uma denúncia sobre uma taxa cobrada indevidamente ou sobre um abuso contra os direitos dos consumidores por parte de um órgão público. A Comissão de Direitos Humanos e Defesa do Consumidor da ALEPA “está de parabéns” por realizar o seu trabalho em benefício da população. Isto é o mínimo que se espera de representantes parlamentares eleitos com o voto popular.
No entanto, encerramos estes escritos com uma reflexão sobre a preocupante aproximação entre “Direitos Humanos” e “Defesa do Consumidor” no interior de uma comissão parlamentar. “Direitos” estão relacionados à cidadania, enquanto “consumo” refere-se ao mercado. É sintomático dos efeitos das políticas neoliberais sobre a cidade contemporânea a transformação de cidadãos em consumidores em potencial. Nosso direito de consumidor foi atendido, não pagamos pelo saneamento que não temos. Acontece que não queremos apenas ser vistos como consumidores. Queremos cidadania plena. Para alcançar a cidadania plena, é necessário assegurar o direito ao saneamento básico por meio de um sistema de coleta e tratamento de esgoto sanitário que seja universal e eficiente, com sua manutenção periódica realizada conforme os manuais técnicos.

A COSANPA vem atestar, infelizmente, que a cidade de Belém ainda se encontra presa a estruturas que remetem às cidades da época medieval européia, quando os esgotos sanitários e as fossas eram descarregados em rios ou pântanos. Enquanto outros centros urbanos procuram soluções – algumas bem sucedidas – para lidar com as conseqüências catastróficas da poluição industrial em seus rios e cursos d’água, em Belém é o nosso COCÔ (sim, não há melhor palavra para descrever o material que navega pelos canais da Bacia do Una) que ainda é despejado na Baía do Guajará. Baía do Guajará, é preciso ressaltar, que está em contato direto com o Rio Guamá, de onde é retirada a água que sai das torneiras e chuveiros de nossas casas (nem) todos os dias.

quarta-feira, 14 de maio de 2014

Primeiro informativo da Frente dos Moradores Prejudicados da Bacia do Una (maio de 2014)

 O verão amazônico se aproxima. As chuvas tendem ficar mais escassas e os alagamentos menos frequentes em Belém. No entanto, isto não é motivo para esquecer as omissões e irregularidades do poder público nos âmbitos municipal e estadual, bem como a falta de posicionamento do Poder Judiciário que vêm resultando na perda de um investimento da ordem de 312.437.727 milhões de dólares: o Projeto de Macrodrenagem da Bacia do Una.

O primeiro informativo da Frente dos Moradores Prejudicados da Bacia do Una já está nas ruas desde o início do mês de maio. Clique sobre as imagens para ampliá-las. Boa leitura!